quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Liquidez da vida

O mundo hoje clama pelo desapego emocional. Me pergunto onde essa nossa modernidade líquida vai nos levar. Cada vez mais observo nas pessoas um vazio tremendo que parece nunca ser preenchido. As relações humanas estão esvaziadas. De amor. De afeto. De carinho. Daquele abraço sincero. Do ombro amigo.

O facebook parece ser o vínculo, o elo das relações humanas. O mais triste é acharmos isso natural. Já foi-se o tempo daquelas horas a fio no telefone, das cartinhas, do telegrama e até do email! A globalização encurtou as distâncias e facilitou a comunicação, mas a que preço? O que eu vejo, atualmente, é a pressa. Pressa das próprias pessoas se comunicarem. O mundo anda tão voraz que mal temos tempo para nos encontrarmos. E quando esse encontro acontece ele é frio, sem tesão, sem vontade.

Vejo uma banalização tremenda do amor e do respeito. Não trocamos mais nossos olhares apaixonados, não andamos mais de mãos dadas, não estamos dispostos a compartilhar sonhos e problemas. Aparentemente todo o nosso foco é voltado para nós mesmos, sem olhar para o próximo. Somos cada vez mais egoístas e mesquinhos. Agora é olho por olho, dente por dente. Nossas relações possuem um peso enorme e muita cobrança. Não reconhecemos mais os gestos do próximo. Clamamos por independência, mas precisamos reconhecer que precisamos do outro, precisamos do brilho nos olhos, de uma afago de vó, do beijo apaixonado, daquela mãozinha pra seguir adiante. Parece que perdemos o tato, o jeito de amar, de compartilhar medos e fazer planos. Parece que as pessoas sentem um certo receio de confiar, de partilhar problemas e reconhecer a necessidade de ter o outro. Já dizia Tom Jobim: fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho.

Hoje em dia vivemos em um cruel paradoxo: ou somos cada vez mais emocionalmente dependentes do outro, o que nos prende, nos limita; ou queremos a liberdade de ser, de amar, de ir. O mundo me parece estar em uma constante superficialidade. E ela só cresce. Me pergunto aonde esses amores líquidos nos levarão.

Proponho um regaste aos velhos tempos com o sentimento de liberdade de hoje. Explico. Na época dos nossos avós os sentimentos me pareciam mais intensos e verdadeiros. Não tínhamos a internet e as redes sociais para nos comunicarmos. Era olho no olho, conversas horas a fio na janela. Tudo era muito mais singelo e simples. Hoje parece que complicamos demais as relações humanas de uma maneira que as tornam pesadas. Deveríamos utilizar nossa liberdade não como uma forma de conseguirmos nossa independência a qualquer custo, mas como uma maneira de não estarmos psicologicamente dependentes do outro,

Que amemos muito, verdadeira e intensamente, não tendo receio de embarcar em um voo conjunto, preenchido de mil desafios e planos, mas que saibamos utilizar a nossa independência para termos o nosso próprio voo solo.

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segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Quebra-cabeça

A gente costumava se completar, nós éramos aquele casal meio louco mas que se encaixava de alguma maneira, como as peças de um quebra-cabeça. Uma maneira única e só nossa. Tínhamos uma conexão quase ininteligível, densa, talvez pelo fato de nos conhecermos tanto e há tanto tempo. Hoje eu me pergunto o porquê disso tudo. Talvez lá na frente essa minha visão embaçada me permita ver além, me permita entender. Talvez não. Tudo é tão obscuro na minha mente, tudo parece tão fugaz, tão superficial frente a tudo que vivi. A frieza na pele compensa pelo coração gigante. Talvez você não tivesse percebido isso a tempo. Talvez meus sinais não tenham sido captados na mesma velocidade de antes. Erro meu e seu? Acho que não. Algumas coisas na vida simplesmente acontecem e temos que aceitar. A maturidade talvez me ensine isso. Agora eu sou só sentimento, desafiando a racionalidade capricorniana. Acho que minha ascendência em peixes aflora nessas horas. Essas linhas me parecem um pouco tortuosas. Escrevo talvez para me libertar, não de sentimentos ruins, mas do passado. Acredito que tudo o que vivemos e passamos acontece por algum motivo, que muitas vezes é desconhecido por nós. Não conhecemos as pessoas por acaso. Cada um que cruzamos nos provoca algo e é incrível os laços que podemos criar com eles. Alguns são desfeitos, outros reforçados. Alguns se afastam, outros vem lá do passado para preencher o nosso futuro. Nunca saberemos. Esse é o lado mais bonito e cruel da vida: não saberemos o que se passará. Nesses (des)encontros da vida a gente aprende e evolui. Às vezes procuramos o nosso eu no outro, outras, procuramos o outro em outros corpos. Nunca acharemos. Dói, dói demais acordar e perceber a ausência, a distância, aqueles planos que não se concretizarão que eu construía na cabeça. Você me dizia que eu planejava demais as coisas, e é bem verdade. Fazia planos porque eu acreditava em um futuro compartilhado, talvez você não. Respeito isso, respeito tua liberdade. Talvez você não estivesse mais vivendo do jeito que queria comigo...talvez você precisasse de uma peça nova do quebra-cabeças para se preencher. Hoje eu sou só dúvidas e indagações, tal qual essas linhas. Acho que nem você pode me dar essas respostas. Quem sabe o tempo possa..
Nesse brainstorming interno, vou me jogando nesse mundo com a intensidade de sempre, aprendendo todos os dias, me encontrando e me perdendo de mim mesma para sempre crescer com meus erros. Doloroso é achar que talvez agora falte uma peça importantíssima nesse quebra cabeça da vida, mas que ele será preenchido, em algum momento e será finalmente completo.