sábado, 1 de dezembro de 2018

Tetas à tapa: a hipersexualização do corpo da mulher

A capa de dezembro da revista Marie Claire foi estrelada pela atriz global Leticia Colin, sob o tema "Meu Corpo, Minhas Regras". No entanto, a foto veiculada na capa e divulgada nas redes sociais foi censurada pelo Instagram sob a alegação de que: "removemos sua publicação porque ela não cumpre nossas Community Guidelines em nudez ou pornografia. Se você infringir nossas diretrizes mais uma vez, sua conta será restrita ou desativada (...) removemos algumas fotos de mamilos femininos, mas fotos de cicatrizes de mastectomia e mulheres amamentando são permitidas". 

A posição tomada pelo Instagram é metonímia da função específica de divulgação do corpo feminino e seus limites e nuances, na medida em que é considerada natural e até bonita a disseminação de imagens de mulheres amamentando seus filhos ou então demonstrando a batalha cotidiana contra o câncer de mama, mas, em um editorial de moda, a mostra dos seios femininos é colocada como repugnante e uma afronta à moral e os bons costumes, sendo comparada à pornografia. 

O que choca e revolta é que quando algumas partes do corpo das mulheres são veiculadas sob um tom de feminilidade, de amabilidade, como em fotos de amamentação de bebês, a receptividade é clara. É colocada a imagem da mulher maternal e doce, cumprindo seu papel social de mãe, esposa e dona de casa. Nesse mesmo raciocínio, a disseminação de fotos de mulheres que sofreram a mastectomia demonstra a concentração de forças para a prevenção do câncer de mama, uma das doenças que mais mata mulheres no mundo. Em nenhum desses casos, a foto dessas mulheres são sexualizadas, mas, pelo contrário, vista com bons olhos e de acordo com o padrão natural de condição do papel da mulher sob o olhar da sociedade patriarcal. 

Por outro lado, quando é veiculada a imagem de uma mulher com os seios à mostra, com claro objetivo de manifesto e protesto, esta é hipersexualizada e incomoda tanto que a mídia tenta escondê-la, quase que numa tentativa de impedir que tal "afronta" à sociedade possa ser disseminada. A partir daí, entra-se no lugar-comum de que a mulher "deve-se dar o respeito" e "se guardar", de forma a não incitar vontades e desejos masculinos. 

Com isso, remontamos ao ponto de partida inicial para reflexão: por que os homens podem andar sem camisa e as mulheres não? Qual a condição feminina necessária para que as mulheres ganhem a emancipação de seus corpos, de forma a utilizá-los como bem quiserem, atribuição essa exclusivamente destinada aos sexo masculino? Por que choca tanto a veiculação de imagens de partes do corpo feminino utilizadas essencialmente para exaltar seus corpos?

Uma das respostas possíveis é que a sexualidade feminina só é bem aceita quando é exercida em função do homem e para o homem, quando assim este a desejar. Quando não lhe for interessante, ou quando isso incidir em um debate sobre gênero e papeis sociais desempenhados, a imagem é deturpada, omitida, proibida. 

Leticia Colin foi extremamente corajosa por se doar e colocar literalmente as tetas à tapa, juntamente com a chefia editorial da Marie Claire, para debater um pouco mais o corpo da mulher e ressignificá-lo, de forma a convidar às pessoas ao debate sobre gênero, sexualidade e sexualização de corpos e a luta incansável para desconstruir padrões e práticas machistas e patriarcais como essa. 


sábado, 31 de março de 2018

Um dia, moço

Um dia um moço me relembrou o calor de um abraço de amor, me fez suspirar de novo, como há muito não fazia; me fez querer fazer planos com ele e a querer me reinventar de novo;

Um dia um moço me fez enxergar que dar dois passos pra trás às vezes deixa a caminhada mais leve e tranquila do que qualquer passo mais apressado;

Um dia um moço me fez ser ainda mais livre, me deixou voar por aí porque sabia que ao final do dia ele teria minhas asas nas dele;

Um dia um moço me fez acreditar no agora, no instante presente, no que somos capazes de ser e mudar, ao pouquinhos, mas sempre seguindo em frente;

Um dia um moço acreditou e investiu em mim, falou que eu era grande, forte e sempre estaria lá pra me lembrar disso;

Um dia um moço me pegou com ternura e carícias, falando baixinho no ouvido confidências e segredos;

Um dia um moço me aninhou em seus braços, me fitou com um olhar apaixonado e pousou delicadamente nos meus lábios;

Um dia um moço me relembrou o que é amar e ser amada;

- Mas só um dia, moço?

- Quem sabe, sempre?